Considerando que Alis Ubbo, a "enseada amena" desde há 3200 anos e mais conhecida por Lisboa, ainda não tinha gente suficiente a maçar a blogosfera, decidi juntar-me à festa...

domingo, 25 de março de 2007

Que futuro? - A Europa enquanto solução

E ainda a propósito deste dia deixo aqui um texto sobre a construção europeia que fiz para o jornal da minha faculdade, o Improp, já lá vai um ano...



Que futuro? – A Europa enquanto solução

Na era de incertezas em que nos encontramos, incertezas quanto ao futuro do nosso país e do nosso continente, do nosso clima e da paz global, impõe-se uma reflexão sobre o presente. Numa época em que velhas nações renascem após uma decadência de séculos (a Índia, a China, o sudeste asiático), um pequeno país de uma dezena de milhões de habitantes questiona-se sobre a sua sobrevivência devido à concorrência de gigantes de biliões.

Antes de mais há que pôr de parte a reacção medrosa e hipócrita de fechar o nosso país aos produtos estrangeiros, chineses incluídos, e aos imigrantes. Salazar bem tentou tornar o país orgulhosamente só, mas ao tentar fazê-lo condenou à miséria e à ignorância milhões de portugueses. Resultados idênticos tiveram outros regimes fascistas e os regimes comunistas. E já que os ocidentais, portugueses incluídos, se gostam tanto de martirizar e arcar com as culpas de três quartos dos problemas do mundo (e de que são em parte os culpados), então deveriam ser os primeiros a ficar contentes pelos crescimentos económicos desconcertantes das nações menos desenvolvidas nos últimos anos. Mesmo que estes prejudiquem transitoriamente as nossas sociedades. Mas muitos não ficam. Ficam antes com medo e é aqui entra a hipocrisia.

Os movimentos anti-globalização ainda não perceberam que aquilo que impulsionou este crescimento foi a economia de mercado, vulgo capitalismo. Aquele capitalismo e aquela globalização, contra quem alguns ocidentais vociferam tão ferozmente, já tirou mais chineses da pobreza em uma década que o comunismo em cinco. Isto não é nenhum elogio a este regime económico. Antes deve ser entendido como uma simples constatação e ponto de partida. Assim, não é no regime económico que está o cerne do nosso problema. O capitalismo, como a democracia segundo Churchil, é um péssimo regime, mas mesmo com os seus horríveis defeitos continua a ser o melhor de todos os sitemas económicos.

Não, a mudança a ser feita não é económica. Não, a globalização não é o problema. Não, o liberalismo económico não é o problema. Não, a China não é o problema. O problema somos nós. Nós, o nosso sistema e a nossa sociedade é que têm de mudar, pelo menos em algumas coisas. E este problema estende-se aos restantes 450 milhões de pessoas que constituem a União Europeia. No século XXI, numa época de estagnação económica para o nosso continente, nós, europeus, já não estamos em posição de exigir que o resto do mundo se adapte ao nosso ritmo e se organize de acordo com a nossa vontade. Por que os tempos mudaram, nós devemos mudar também para podermos conservar os nossos valores políticos e sociais, bem como o nosso modelo social. Num mundo de 6 biliões de pessoas, mais democratizado do que alguma vez o foi, 10 milhões de portugueses não podem (e ainda bem) ter qualquer papel maioritário na tomada de decisões mundiais, se agirem individualmente. Não seria justo. O mesmo se passa com os 40 milhões de espanhóis, os 5 milhões de dinamarqueses ou os 16 milhões de holandeses. Mas 450 milhões de europeus podem, devem e têm esse poder.

A outrora chamada Comunidade Europeia ajudou o nosso continente a recuperar de duas guerras fratricidas que o deixaram total e literalmente em ruínas. Pela primeira desde o Império Romano os europeus ocidentais não se envolveram em guerras entre si durante mais de 60 anos. A Europa tornou-se mais rica e mais pacífica do que nunca. Tudo isto foi possibilitado em grande parte pela tomada de consciência dos europeus, que viram na progressiva união económica e política a única forma de ultrapassar a devastação da guerra e a sobrevivência da própria Europa.

Europeus sempre existiram, mas antes da 2ª Guerra poucos eram aqueles que tinham a percepção de que como europeus, partilhavam um conjunto de valores, tradições políticas e históricas únicas. A guerra acabou por dar à maior parte dos europeus um objectivo comum: impedir que tal catástrofe voltasse a ocorrer em solo europeu e fomentar a reconstrução de um continente deixado na miséria e na ruína. Estes factores permitiram a concretização daquilo a que se chamou “o projecto de construção europeia”. Um projecto que ainda não está definitivamente acabado mas que já provou a sua eficácia.

Agora que quase todas as nações europeias abandonaram um pouco da sua soberania milenar em questões tão importantes como o mercado, a moeda, a justiça, o ambiente, novas questões se colocam. Considerando que a união de esforços de todos os países europeus é imprescindível para a sobrevivência do nosso continente enquanto pólo de democracia e riqueza, muitos argumentam que o futuro da Europa e do nosso país passa pela criação de uma Federação Europeia.

Isto significaria a criação de uma espécie de super-estado europeu. Este teria uma política externa e um exército próprios que agiriam em nome do bem comum de todos europeus. Os domínios em que fosse vantajosa para o continente a existência de políticas comuns em todos os países, estariam sob a sua alçada.

Ao contrário do que muitos dizem, isto não implica nenhum suicídio das culturas nacionais europeias. Desde quando um português não se pode sentir também portuense ou alentejano. O europeísmo é perfeitamente compatível com o patriotismo, e este último com o orgulho regional e local. Seria perigosa a destruição dos valores próprios de cada país ou a uniformização das culturas europeias. Mas verifica-se que tal não aconteceu com o estádio avançado de integração europeia que já se alcançou.

Porque foi o nacionalismo e xenofobia que quase nos destruiram a todos no passado século, urge lutar para os erradicar definitivamente da Europa e construir um futuro baseado nos esforços comuns de todos os europeus. E poderá ser a nossa geração a materializar definitivamente esse sonho, se nós, os jovens de hoje, o quisermos e lutarmos por isso.

Independentemente de se gostar ou não da economia de mercado, da globalização e do crescimento económico do designado Terceiro Mundo, uma reflexão mostra-nos que não é por nós portugueses não gostarmos dele ou da globalização, que estes vão acabar. A nossa nação, país, estado, o quer que se lhe queira chamar, precisa de ser reinventada. O que eu e muitos outros defendem é que isso não é possível usando apenas os nossos poucos recursos de país pequeno que somos. Além de portugueses somos europeus, e é nesta aparentemente pequena constatação que poderá residir o nosso sucesso futuro.

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